A IMPORTÂNCIA DE GIOTTO
![Retrato de GIOTTO DI BONDONE](https://ahistoriadaarte.com.br/wp-content/uploads/Retrato-de-GIOTTO-DI-BONDONE.jpg)
Giotto di Bondone, Cimabue e Duccio di Buoninsegna formam o trio italiano responsável pelo início da transição entre a Arte Bizantina e o Renascimento.
A Arte Bizantina é caracterizada pela rigidez dos personagens, pela representação bidimensional das imagens e por certa “frieza” emocional dos representados. No Renascimento veríamos o oposto disto. Este período de transição, entre a metade do século 13 e o final do século 15 é o que os livros mais resumidos de História da Arte chamarão de “Arte Medieval” – que, em um sentido bem restrito, quer dizer apenas a Pintura deste período, já que a Arte Bizantina prezava mais os mosaicos do que a pintura.
A Pintura, que já era praticada na Roma Antiga, havia sido praticamente deixada de lado durante toda a Idade Média. Assim, muitos livros de História da Arte, especialmente os que entendem por “Arte” basicamente a Pintura Ocidental, começam justamente neste período em que viveram os três italianos. Que podem ser considerados, assim, os (re)fundadores da Arte da Pintura no Ocidente, Arte que de lá para cá não mais morreria.
Livros mais detalhados de História da Arte chamarão ao movimento criado pelos três de Gótico Internacional.
Muito importantes os três, portanto. Entretanto, de certa forma, hoje, Cimabue e Duccio caíram em relativo esquecimento. Não é todo livro de História da Arte que fala dos dois – especialmente Duccio é menos ainda lembrado – enquanto quase todos os livros falam de Giotto.
O que explica, afinal, esta disparidade? Ela é especialmente injusta com Cimabue, já que o artista, nascido quase 30 anos antes de Giotto, é considerado o autor do pontapé inicial para o fim da Arte Bizantina e para a ressurreição da Pintura.
O que explica a fama de Giotto?
Bem, talvez não exista uma razão única, porém o motivo que se pode deduzir é que Giotto di Bondone deu um passo além de Cimabue, naquela transição. E ainda em vida seus contemporâneos consideravam que ele tinha superado o mestre.
Mestre? Conta a história, que talvez seja apenas lenda, embora narrada por Giorgio Vasari em “Vidas dos Artistas”, que Cimabue, uma vez vendo o jovem Giotto desenhando um carneiro em uma pedra, ficou impressionado e o levou para trabalhar consigo em Florença.
Verdade ou não, Giotto, talvez nascido Ambrogio di Bondone, acredita-se, nos arredores de Florença, por volta de 1267, foi ao menos influenciado pelo trabalho de Cimabue. Mas, de fato, o “superou”, se entendermos por superação a ascensão de mais um degrau rumo à tridimensionalidade, à expressão de emoções etc.
OBRAS DE GIOTTO
A “Maestà” de Giotto, por exemplo, é bem mais “viva” do que a de Cimabue – e a de Duccio parece uma cópia exata da de Cimabue.
![](https://ahistoriadaarte.com.br/wp-content/uploads/GIOTTO-Maesta-Madona-Ognissanti-643x1024.jpg)
A “Maestá” de Giotto, assim como a dos colegas, está hoje na Galleria degli Uffizi, em Florença. Assim como a deles, é uma obra grande: 2,04 x 3,25 metros. A de Giotto tem o apelido de “Madonna Ognissanti” porque foi feita originalmente para a Igreja de Todos os Santos, em Florença.
Além das pinturas de têmpera sobre madeira, como a “Maestà”, Giotto também trabalhou em afrescos, como em “O beijo de Judas”. O afresco exige muita perícia porque é feito com a aplicação da tinta sobre argamassa ou gesso frescos (daí o nome da técnica), que secam rapidamente, não permitindo muitos erros e correções.
![](https://ahistoriadaarte.com.br/wp-content/uploads/GIOTTO-O-beijo-de-Judas-1-scaled.jpg)
As feições dos personagens, transmitindo ao observador a emoção que sentiam, era uma das novidades do Gótico Internacional.
“O beijo de Judas” mede 1,85 x 2,00 metros e está em uma igreja na cidade Pádua, na Capela Scrovegni, que recebe o nome da família que financiou sua construção. Em 2021 a UNESCO declarou a capela Patrimônio da Humanidade.
Alguns dos afrescos pintados por Giotto serviriam como material de estudo para os futuros mestres renascentistas. Acredita-se que o artista tenha estudado esculturas romanas, o que lhe permitiu dar mais volume para suas imagens.
O sucesso destes afrescos fez com que Giotto recebesse uma série de encomendas. Por volta de 1310, o seu ateliê já era o principal da Itália – e o artista enriquecia, tornando-se dono de várias propriedades em Florença. Giotto tinha até “seguidores”, chamados de Giotteschi (“giotescos”). Ninguém menos do que Leonardo da Vinci diria que Giotto superou não apenas seus contemporâneos, como também os mestres da Antiguidade.
Entretanto, muitas destas obras, vistas hoje, podem causar certa estranheza. A perspectiva não é perfeita – os artistas ainda tateavam em busca da representação tridimensional. Além disto, em algumas obras algumas pessoas são bem maiores do que outras – porém isto ainda era um resquício da Arte Bizantina, em que havia uma hierarquia, em que figuras mais importantes são mesmo representadas em escala maior.
Em 1334, os líderes de Florença nomearam Giotto como arquiteto-chefe da catedral da cidade – um título mais em homenagem ao seu talento como pintor do que por alguma suposta habilidade como arquiteto. Mesmo assim, Giotto fez um projeto para o campanário da catedral, porém morreria em 1337, antes do fim da obra.
O famoso escritor Boccaccio, pouco após a morte do artista, diria: “Giotto pode ser merecidamente considerado uma das luzes da glória florentina.”
Giorgio Vasari, novamente, sobre o artista: “Ele iniciou a grande Arte da Pintura como a conhecemos hoje, introduzindo a técnica de desenhar a vida com precisão, algo que havia sido esquecido por mais de 200 anos.” E ainda: “Giotto de fato ofuscou a fama de Cimabue, tal como uma luz forte ofusca outra muito menor.”
No século 20, um escultor britânico, Sir Henry Moore, após voltar de uma viagem à Itália, declarou que as pinturas de Giotto di Bondone eram as melhores “esculturas” que já tinha visto.
VIDA (BIOGRAFIA) DE GIOTTO
Embora a fama de Giotto, como pintor, tenha atravessado séculos, o fato é que sobre a sua vida pessoal se sabe pouco. A sua data de nascimento é incerta, assim como a cidade onde veio ao mundo. Alguns trabalhos que podem ser atribuídos a Giotto também geram dúvidas sobre a verdadeira autoria – como os da Basílica de São Francisco, na cidade de Assis.
A tradição diz que Giotto nasceu em uma fazenda e uma casa a algumas dezenas de Florença exibe uma placa dizendo que o artista nasceu lá. Entretanto, mais recentemente pesquisas mais aprofundadas e sérias sobre a vida do artista têm sido conduzidas – e estas apontam que o artista era filho de um ferreiro chamado Bondone e nasceu mesmo em Florença.
O que parece confiável é que o artista se casou e teve quatro filhos, sendo um destes Francesco, que também se tornou pintor.
Contudo, até mesmo sobre o verdadeiro nome do artista há dúvidas: Giotto, Ambrogio (diminutivo: Ambrogiotto), Angelo (Angelloto)?
Tantas dúvidas deixaram grande margem às lendas sobre o artista. Outra contada por Giorgio Vasari parece improvável, mas é bem contada. Estavam Giotto e Cimabue no ateliê deste, quando este precisou sair. Durante a ausência de Cimabue, Giotto pintou, sobre uma obra do seu mestre, uma mosca, muito bem feita. Quando Cimabue voltou, passou um bom tempo tentando espantar a “mosca” da pintura… (A história remete à de Zeuxis, pintor da Grécia Antiga que, diz-se, fez cachos de uvas tão reais que pássaros tentaram bicá-los…)
Mais uma vinda de Vasari. O papa Benedito XI queria uma amostra do talento de Giotto, antes de contratá-lo para uma grande obra. Enviou alguém ao pintor, solicitando um desenho a ser enviado ao Papa. Giotto desenhou apenas um grande círculo. O mensageiro saiu atordoado, com o desenho em mãos, achando que havia sido feito de bobo pelo artista. Quando o Papa viu o desenho, reconheceu o talento de Giotto: o círculo era tão perfeito que parecia ter sido feito com o uso de um compasso.
Uma última. Vasari diz que, segundo Boccacio, “não havia homem mais feio do que Giotto em toda a Florença”. A aparência do pintor também é desconhecida – o retrato que abre este texto foi feito após a sua morte e o autor dele, supostamente um pintor florentino, também é desconhecido. Vasari continua. Os filhos de Giotto também não eram um modelo de beleza, digamos assim. Então Boccacio, uma vez, questionou ao artista: como pintava pessoas tão bonitas e fazia filhos tão… mal acabados… Giotto respondeu, com bom humor: “É que as pinturas eu faço à luz do dia, os filhos faço à noite, no escuro…”
É provável que a maioria destas histórias sobre Giotto não seja verdade – ou, ao menos, que “não tenha sido bem assim”. Porém elas provam uma coisa. Escritas por Giorgio Vasari, que se propôs a ser um biógrafo sério dos artistas que deram à luz o Renascimento, elas indicam que a fama de Giotto, dois séculos após a sua morte, ainda era muito grande – tanto que o vácuo biográfico a seu respeito “exigia” que se inventasse uma história que a justificasse.
De fato, basta olharmos para uma pintura como “Lamentação (Luto de Cristo)”, que também está na Capela Scrovegni, para entendermos por que Giotto recebe, merecidamente, o título de “Pai” desta Arte que amamos tanto, a Pintura.
![GIOTTO di Bondone - Lamentação (Luto de Cristo)](https://ahistoriadaarte.com.br/wp-content/uploads/GIOTTO-di-Bondone-Lamentacao-Luto-de-Cristo-1024x963.jpg)
![GIOTTO di Bondone - Lamentação (Luto de Cristo) [detalhe]](https://ahistoriadaarte.com.br/wp-content/uploads/GIOTTO-di-Bondone-Lamentacao-Luto-de-Cristo-detalhe.png)
SAIBA MAIS:
Confira a resenha do livro “VIDA DOS ARTISTAS”, DE GIOGIO VASARI.
Saiba TUDO sobre a ARTE MEDIEVAL.
Conheça a vida e obras de CIMABUE e DUCCIO.