Vincent Willen van Gogh é um pintor holandês, nascido em 1853, em Zundert, uma pequena vila. Morreria em 1890, em território francês, suicidando-se aos 37 anos.
Van Gogh é considerado atualmente um dos melhores pintores de todos os tempos, mas este reconhecimento ele só obteve após sua morte. Vivo, Van Gogh vendeu apenas um quadro dos mais de 700 que pintou.
A fama atual de Van Gogh se deve a dois motivos. Primeiramente, pela inventividade de sua sua obra, que, embora seja classificada como “Pós-Impressionismo”, pelo período em que foi produzida, tecnicamente está mais para “Pré-expressionismo”. Muito da fama de Van Gogh, entretanto, deve-se à sua biografia: Van Gogh se matou com um tiro, mas antes disso teve surtos de loucura que o levaram a passar uma grande temporada num hospício – e a cortar a própria orelha. O próprio fato de não ter tido nenhum reconhecimento em vida doura ainda mais a história de Van Gogh, aumentando a mitologia do “gênio ignorado”. (Muitos artistas contemporâneos pensam que basta uma biografia falsamente interessante para que entrem para a História da Pintura. Outros pensam que se a crítica os ignora é um bom sinal, crêem que no futuro sua genialidade será reconhecida e serão resgatados do limbo.)
Van Gogh não era o único louco em sua família. Sua mãe tinha “crises nervosas”. Wilhermina, sua irmã, provavelmente ra esquizofrência e viveu 40 anos num mesmo asilo. Outro irmão, Cornelius, suicidaria-se aos 33 anos. Theo, irmão 4 anos mais novo, tinha depressão e morreria logo após Van Gogh, com o diagnóstico de “demência paralítica”.
Vincent Van Gogh já nasceria com uma carga pesada, além desta genética. Antes de seu nascimento, seus pais tiveram o primeiro filho, cujo nome era… Vincent! Só que o primeiro Vincent morreu com seis meses de idade. Quando nasceu o próximo filho, o Van Gogh que conhecemos, deram a ele o mesmo nome do falecido, como se ele pudesse substituir o morto. Toda semana a família visitava o túmulo do primogênito e fazia comparações depreciativas entre o falecido e o segundo Vincent.
Van Gogh não nasce para ser ele mesmo, portanto, mas para exercer a impossível função de ser um outro. É bastante tentador vermos nisto, se não a causa, ao menos o primeiro gatilho para sua loucura, que se manifestaria muitos anos depois.
Van Gogh foi uma criança que gostava de se isolar e andar pelos campos, onde via árvores retorcidas e céus nublados que, mais tarde, voltariam em seus quadros.
Após passar quatro anos em um internato, em 1869 Van Gogh começou a trabalhar, com 16 anos, em uma galeria de Arte, em Haia (a convite de um tio, também chamado Vincent…), onde teve a oportunidade de conhecer vários estilos e começou a colecionar gravuras. Tendo conseguido uma transferência para passar também um período em Bruxelas (Bélgica), Van Gogh ficou nesta galeria por alguns anos. Theo foi trabalhar com Vincent e os dois moraram juntos por alguns meses.
Van Gogh foi transferido então para a Inglaterra, em 1873, onde pintou seus primeiros quadros. Mas toda a falta de luz causada pela névoa londrina o deprimia. Em Londres, Van Gogh ainda sofreria a primeira desilusão amorosa, após receber um “não” como resposta a um pedido de casamento que fez à filha da dona da pensão em que morava.
Van Gogh, que até então era um bom funcionário da Galeria Goupil, tornou-se ausente, confuso. Sonhando com a vida em Paris, conseguiu transferência para a capital francesa em 1875.
Em Paris, lia muito e, obviamente, nutria sua paixão pela pintura – gostava dos pintores franceses Eugène Delacroix (1798 – 1863) e Gustave Courbet (1819 – 1877), entre outros. Já detestava o trabalho na galeria, discutia com clientes que discordavam de suas opiniões, e acabou sendo demitido, em 1876, com 23 anos.
Van Gogh voltou para a casa de sua família, mas, não aguentando o ambiente, voltou para a Inglaterra, agora como professor em uma escola anglicana. A família de Van Gogh era muito religiosa (seu pai era pastor calvinista) e isto o influenciara muito nos primeiros anos de vida. Na Inglaterra, Van Gogh tomou contato com a pobreza e isto o marcou muito. Quando foi demitido da escola, passou a ser ajudante de um pregador. Escreveu, dividido, ao irmão Theo: “Acredito que o ofício de pintor ou artista é belo, mas creio que o ofício de meu pai é mais sagrado. Gostaria de ser como ele.”
Van Gogh queria muito ajudar no consolo dos pobres, mas não tinha a vocação para a pregação e acabou sendo demitido até desta função.
Voltou então para a Holanda, mas ainda cogitando ser pastor. O pai resolveu mandá-lo para a Universidade de Amsterdã, para estudar Teologia. Mas Van Gogh foi reprovado nos testes admissionais. Em 1878, com ajuda do pai, acabou conseguindo um posto de pregador entre mineiros, que trabalhavam em lugares insalubres, sufocantes. Mas Van Gogh os via como mais pobres ou sofredores do que realmente eram, e, no seu desespero para salvá-los, passou a tentar viver como eles. Eles se assustaram com seu misticismo exagerado, e Van Gogh acabaria por perder mais este posto.
Voltou mais uma vez para casa, mas era cada vez menos bem recebido. Perambulou, então, por um tempo, às vezes sem ter nem o que comer.
A sua fé arrefeceu e, em 1880, já com 27 anos, resolveu finalmente virar pintor.
Theo van Gogh (a quem Van Gogh, quando distante, escrevia longas e frequentes cartas – centenas, que ajudariam muito aos historiadores traçar a biografia e os pensamentos artísticos do pintor) ocupava um alto cargo, a esta altura, na Goupil – e o ajudava financeiramente.
Van Gogh escolheu o caminho do auto-didatismo. Não sem voltar, o perseverante Van Gogh, às minas de Borinage… Que agora passaram a ser seu tema. As telas de Van Gogh, entretanto, encontraram recepção fria.
Como o irmão Theo iria passar uma temporada na casa dos pais, Van Gogh foi encontrá-lo, mas apaixonou-se por uma prima, o que deixou seu pai furioso. Além disto, a garota o rejeitou.
Vincent foi para a casa de um primo pintor, Anton Mauve, que morava em Haia. Nesta época, fez litografias, desenhos e aquarelas – ainda representando trabalhadores. Quando Van Gogh acolheu uma amante alcoolista, houve desentendimento com o primo. Mais uma vez, Van Gogh retornava à cidade onde agora estava o pai… Mas, desta vez, alugou dois cômodos, fazendo de um o ateliê. Nova desilusão amorosa – e uma certeza: a Pintura era a “única maneira de viver sem pensar no passado”.
No início de sua carreira, Van Gogh não abandonou completamente a vida cristã, já que em suas primeiras telas, como “Os comedores de batata”, de 1885, a temática é social, retratando a vida dos pobres – como o francês Jean-François Millet (1814 – 1775) havia feito. Numa tela escura, o dramático Van Gogh parecia conseguir o efeito que desejava: que suas telas parecessem ter sido feitas com a terra que estes trabalhadores pisavam.
Seu pai morreu este ano – e o padre já não permitia que os fiéis servissem de modelo. Van Gogh foi para Antuérpia, grande cidade belga, onde tomou contato mais profundo com a obra do alemão Peter Paul Rubens (1577 – 1640), cujo colorido criou o Estilo Barroco. Isto deve ter influenciado a paleta de Van Gogh, que se tornaria muito vívida.
Com incentivo de Theo, Van Gogh chegou a frequentar, por curto período, a Academia de Belas Artes.
Em 1886, Van Gogh foi para a efervescente Paris, França, onde Theo agora estava, e onde estudou no ateliê do pintor de cenas históricas Fernand Corman e se tornou amigo de pintores como Emile Bernard (1868- 1941), Henri de Toulouse-Lautrec (1864 – 1901) e Camille Pissarro (1830 – 1903). Pissarro, profeticamente, disse de Van Gogh: “Este homem ou enlouquecerá ou nos superará a todos.” Pissarro só não conseguiu ver que as duas coisas poderiam acontecer.
Van Gogh reunia-se com alguns pintores na loja de materiais de pintura do “Pai Tanguy”, que viria a ser retratado algumas vezes pelo pintor.
Em Paris, Van Gogh se dedicou a estudar a teoria das cores e o efeito dos contrastes. Também se interessou pelas xilogravuras japonesas, em moda, na época.
Van Gogh tinha uma personalidade sensível demais, e não aguentou bem o ritmo (e o absinto) parisiense, onde, para ele, havia muita competição e nenhum reconhecimento. Após uma briga com Theo (e outra decepção amorosa, desta vez com a diretora de um cabaré), mudou-se para o sul da França, em 1888, seguindo um conselho de Lautrec. A relação dos dois irmãos era muito intensa e este continuou a ajudar Van Gogh a se sustentar.
Van Gogh foi para Arles. A idéia de Van Gogh era criar uma colônia de artistas. Este período da vida do artista foi extremamente produtivo, tendo feito mais de 200 obras em apenas 15 meses. O sol do sul influenciou muito a sua paleta – vide a série “Os girassóis”. Também fez muito retratos, como os da família do carteiro Joseph Roulin.
Ainda em 1888, o pintor Paul Gauguin (1848 – 1903) foi ao encontro de Van Gogh. Trabalharam juntos por algumas semanas, mas a relação se deteriorou rapidamente. Van Gogh, que bebia e fumava muito, na noite de Natal discutiu com Gauguin, por causa de uma mulher. Van Gogh tentou matar Gauguin e, horas depois, surtou e cortou uma orelha. Pegou a orelha cortada e levou-a para a mulher em questão, uma prostituta. Gauguin, compreensivelmente, foi embora – e Van Gogh foi internado por duas semanas. Um médico, Felix Rey, que também seria retratado por Van Gogh, o diagnosticou como epiléptico. (O absinto pode facilitar o aparecimento de crises, e a cânfora que Van Gogh espalhava em seu colchão para tratar sua insônia também.)
Um mês após o episódio da orelha, Van Gogh fez o auto-retrato em que aparece com uma faixa no rosto.
Van Gogh começou a ter alucinações. Em 1889, em nova crise, Van Gogh se internaria voluntariamente – mas, no manicômio, continuaria a pintar, fazendo inclusive cópias de telas de alguns seus artistas franceses favoritos: Millet, Delacroix e Honoré Daumier (1808 – 1879). O pintor francês Paul Signac (1863 – 1935) o visitou e relatou que Van Gogh ingeria também terebintina, um solvente utilizado na pintura. Há uma suspeita, portanto, de que Van Gogh fosse viciado em terpenos (tuinona, do absinto; cânfora; pineno, da terebintina) – em surto, Van Gogh chegou tentar comer uma tela.
Em Arles a população tinha medo de Van Gogh e fez um abaixo-assinado para que fosse expulso.
Em 1890, o pintor se mudou para Auvers-sur-Oise, cidade próxima a Paris. Mas sua doença o acompanhou. Foi atendido pelo Dr. Gachet, que escrevera um tratado sobre a melancolia (e foi retratado bem desanimado…) e diagnosticou em Van Gogh intoxicação por terebintina e lesão cerebral pela luz solar intensa do sul… Gachet comprou tinta e pincéis para Van Gogh. Gachet é retratado com uma planta que tem uma substância, o digital, que era às vezes usada para tratara epilepsia e pode ser tóxica – mas não há relatos de que tenha sido utilizada no tratamento de Van Gogh. A intoxicação por digital pode alterar a visão e alguns propuseram que isto explicaria alguns aspectos dos desenhos de Van Gogh, como os halos intensos…
Em Auvers-sur-Oise Van Gogh pintou a famosa “Campo de trigo com corvos”. Neste ano, que seria o último de sua vida, é que houve um elogio à sua obra, em um jornal, e foi realizada uma exposição na Goupil, quando pela primeira vez um quadro seu (“A vinha vermelha”) encontrou um comprador.
Em julho deste ano, Van Gogh se encaminhou para o campo e deu um tiro no peito. Chegou cambaleante em um café e disse: “eume feri com um tiro e só espero que tenha realizado este ato de forma adequada.” Foi hospitalizado e seu irmão Theo foi cuidar dele. Gachet não conseguiu retirar a bala e Van Gogh não se importou: “Farei tudo novamente, não chorem. Eu fiz isto para o bem de todos nós.” Van Gogh morreu alguns dias depois, nos braços de Theo, murmurando: “A tristeza não tem fim.”
Theo se desestabilizou emocionalmente e, pouco tempo depois, também foi internado em um hospital psiquiátrico. No início de 1891, Theo também morreu.
Em 1914, o corpo de Theo foi exumado e colocado ao lado do irmão Vincent, em Auvers-sur-Oise